A I Jornada de Direito Comercial trouxe ao Superior Tribunal de
Justiça, na manhã desta segunda-feira (22), o debate sobre a crise na
jurisdição do STJ, o excesso de recursos, o impacto sobre as demandas
ligadas à área comercial e os caminhos para resolvê-las. O tema conduziu
o primeiro painel, que teve como expositores os ministros Sidnei Beneti
e Villas Bôas Cueva, ambos da Segunda Seção do STJ, especializada em
direito privado.
O ministro Sidnei Beneti, ao abrir o painel “O Direito Comercial na
Jurisprudência do STJ”, classificou o ramo como “o direito rebelde”. Ele
explicou que, nas últimas décadas, houve uma verdadeira revolução na
área, o que continua a acontecer diariamente. “Os negócios criam fatos
novos a serem enfrentados”, disse Beneti, referindo-se à evolução da
atividade comercial na sociedade.
O ministro citou os dois elementos que, no seu entender, vetorizam a
interpretação do contrato: a nova contratualidade com o Código de Defesa
do Consumidor (CDC) e a nova contratualidade com o Código Civil (CC) de
2002. Modernamente, afirmou Beneti, é preciso ler os contratos com
olhos nos princípios do CDC e do CC/02.
O ministro afirmou que essas interpretações, que por vezes são
verdadeiras alterações, podem surpreender os contratantes. Como exemplo,
citou a exclusão do foro de eleição, a impenhorabilidade do bem de
família e a proteção ao pequeno investidor. O resultado deste cenário em
mutação é o crescente número de processos, inclusive no STJ.
“Houve época em que os ministros da Seção de direito privado chegaram
a receber entre 1.500 e 1.700 novos processos por mês, cada um”,
revelou. O ministro identificou três institutos que frequentam muito o
Tribunal: a nova desconsideração da pessoa jurídica, os valores das
astreintes (multa judicial para forçar o cumprimento de obrigações) e a
trava bancária.
“Essa enorme quantidade de processos traz grande dificuldade para a
consolidação da diretriz jurisprudencial. Ela fragmenta, ela dispersa,
ela espalha verdadeira cizânia na interpretação contratual. E esta
cizânia se alimenta, formando um círculo não virtuoso, mas um modo
perpétuo que vai nos trazer novas questões para a vida negocial e para a
atividade jurisdicional”, disse Beneti.
Crise de jurisdição
Ao iniciar sua exposição, o ministro Villas Bôas Cueva foi
contundente ao avaliar que o STJ não tem desempenhado a contento sua
função de preservação da lei federal e uniformização da jurisprudência
no país.
Por trás desse quadro, ele aponta causas que, em si, são fatos
positivos: o aumento do acesso à Justiça, da noção de cidadania e, por
consequência, das demandas que tratam do cotidiano das pessoas. No
contexto desse crescimento da procura pela prestação jurisdicional,
segundo o ministro, acaba por aumentar também a quantidade de processos
que chegam ao STJ versando sobre temas que não deveriam chegar até ele –
como honorários advocatícios e execuções. A consequência é o retorno
constante, à Segunda Seção, de questões que já estão definidas, enquanto
outros pontos importantes são deixados de lado.
“Esta crise de jurisdição do STJ é o resultado da própria jurisdição
em geral”, resumiu. Para o ministro Cueva, tudo isso é reflexo da
deficiência deixada pela Emenda Constitucional 45 (a Reforma do
Judiciário de 2004), no sentido de não dar ao STJ o mesmo tratamento que
deu ao Supremo Tribunal Federal, como o instituto da repercussão geral,
capaz de selecionar quais as questões relevantes que merecem a sua
atenção.
O ministro acredita que a aprovação da PEC 209/2012, que institui a
arguição da relevância da questão federal no STJ, pode mudar este
cenário. “A partir daí, poderemos analisar as questões que
verdadeiramente são importantes para a definição dos institutos de
direito comercial”, afirmou.
Caminhos alternativos
Porém, antes que isso aconteça, é possível lançar mão de outras
ferramentas, assegurou o orador. Assim como disse Sidnei Beneti, o
ministro Cueva destacou a importância da conciliação. Beneti contou que
em países como a Alemanha há a figura do ombudsman de bancos, seguros e
planos de saúde. O objetivo é evitar a judicialização das demandas.
“Uma vez proclamada a tese pelo tribunal superior”, explicou Beneti,
ao falar do exemplo alemão, “ela passa a ser aplicada pelo ombudsman
mediante provocação dos interessados que procuram a empresa.” Se o
julgamento for de até cinco mil euros contra o banco, a decisão será
vinculante para a empresa, que terá de acatá-la; se for a favor do
banco, o consumidor poderá entrar em juízo.
O ministro Cueva ainda destacou que o uso de um plenário virtual
agilizaria os julgamentos. Da mesma forma, com um centro de
classificação de feitos, podem ser corrigidas as classificações erradas,
o que traria mais eficiência para o STJ.
A I Jornada de Direito Comercial é uma iniciativa do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF).
Fonte: Correio do Brasil.
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