Passado um pouco o impacto inicial da
Medida Provisória n° 627, que provocou uma verdadeira reforma na legislação do
imposto sobre a renda, as empresas estão analisando os seus efeitos, mas ainda
numa posição encruzilhada: até que ponto o texto original dessa MP será
alterado no Congresso Nacional e quais emendas serão aceitas.
A certeza do
texto legal é imprescindível para a tomada de decisões na área tributária,
porém, segundo nota publicada no Valor Econômico, em sua edição de 28 de
janeiro de 2014, a votação do texto de conversão dessa MP ocorrerá somente em
março. Acontece que o tempo não para (como Cazuza já cantou) e a temporada de
publicação das demonstrações contábeis já começou.
Por conta disso, o Instituto
dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) emitiu o Comunicado Técnico n°
2, de 2014, para tratar da “avaliação dos procedimentos da administração das
entidades sobre os efeitos da Medida Provisória nº 627, de 11 de novembro de
2013”.
As orientações do Ibracon já são importantes por si só, mas, com relação
às demonstrações contábeis relativas ao ano calendário de 2013, como é o caso
desse comunicado técnico, a importância é mais abrangente. Isso porque a
Receita Federal passou a exigir, a partir do envio dos arquivos do Sistema
Público de Escrituração Digital (Sped) de 2013, a informação sobre os auditores
independentes das sociedades por ações e das sociedades limitadas de grande
porte. Portanto, sendo necessário que essas empresas submetam suas
demonstrações contábeis à auditoria externa, a sua elaboração deverá atentar
para o mencionado comunicado técnico do Ibracon.
De acordo com essa
manifestação do Ibracon, as empresas deverão informar ao mercado – normalmente,
por meio de nota explicativa – os impactos, os efeitos e as providências a serem
tomadas com relação às disposições contidas na MP 627 e na Instrução Normativa
da Receita Federal n° 1.397, inclusive com opiniões legais, se o caso (CT
Ibracon n° 02/2014, item 7). Na preparação desse diagnóstico, é importante ter
em mente que essas normas legais e regulamentais (infralegais) referem-se,
exclusivamente, à apuração dos tributos sobre a renda (IRPJ/CSLL) e sobre as
receitas (Contribuição para o Pis e Cofins).
Com isso, em princípio, não haverá
impactos a mensurar nas contas contábeis em si. Exceções óbvias devem ser as
contas contábeis relacionadas a esses tributos, especialmente a provisão e a
respectiva despesa.
Dividendos
Além disso, esse diagnóstico deve considerar a
apuração dos lucros societários (contábeis) durante o período de vigência do
Regime Tributário de Transição (RTT) – 2008 a 2014/2015.
Um dos pontos mais
relevantes de impacto tributário desse período é a pretensa limitação na
distribuição de dividendos. Por conta disso, a referida MP previu a remissão
(perdão) para o suposto imposto sobre o “excesso” de dividendos distribuídos
pelas empresas, todavia, de maneira vinculada à antecipação voluntária dos
efeitos das novas normas tributárias.
Daí, a enorme relevância da opção por
aplicar os dispositivos da MP já em 2014 – uma vez exercida essa faculdade, é
lícito concluir pela não aplicação da famigerada IN 1.397. Não há dúvidas sobre
a necessidade de avaliar o aproveitamento da remissão, mas, por outro lado, não
se pode perder de vista que esse benefício fiscal somente tem sentido se for
aceita a tributação do “excesso” de dividendos – posição conservadora que
contraria toda a legislação tributária aplicada ao caso.
Como mencionado, as
providências a serem avaliadas restringem-se à matéria tributária. Não haveria
impactos nas demonstrações contábeis, ressalvadas as contas relativas aos
tributos envolvidos. Todas as conclusões da administração da empresa devem ser
devidamente documentadas e respaldadas, se for o caso, por opinião legal, quer
de advogados internos quer de advogados externos. Outro obstáculo nessa
encruzilhada é o desconhecimento sobre a forma e sobre o prazo para que a
empresa manifeste sua opção, antes que suas demonstrações contábeis sejam
publicadas.
A combinação dessa dúvida com aquela relacionada ao texto da MP que,
finalmente, será sancionado pela presidente da República, implica que as
informações prestadas pelas empresas nas suas notas explicativas, em
decorrência do comunicado técnico do Ibracon, não serão definitivas.
A par
disso, a importância da informação sobre o impacto das novas normas tributárias
não diminui em nada. Considerando que, em alguma medida, os impactos, os
efeitos e as providências a serem tomadas com relação às disposições contidas
na MP 627 e na IN 1.397 pode influenciar a tomada de decisões da administração,
dos investidores e do mercado em geral, com relação às empresas, pode-se
concluir que essa informação se enquadraria como “fato relevante”, nos termos
da Instrução CVM n° 358.
Como se vê, a integração tributária dos padrões
internacionais de contabilidade (IFRS) continua extrapolando os limites da
tributação para questões relacionadas ao direito societário e aos contratos
firmados pelas empresas.
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