A Justiça Federal de São Paulo decidiu que não há violação de informação
sigilosa se os dados são transferidos entre entidades obrigadas a manter esse
sigilo. O entendimento é do juiz Dasser Lettiére Júnior, da 2ª Vara Federal de
São José do Rio Preto (SP), que negou pedido de uma empresa de confecção que
tentava impedir a Receita Federal de ter acesso a seus documentos e informações
bancárias.
Na sentença, o juiz discutiu a constitucionalidade da Lei Complementar
105/2001, que regulamenta o trato de informações bancárias sigilosas. Ele
afirmou que o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal determina a
inviolabilidade da intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas. Já o
inciso XII do mesmo artigo estabelece a inviolabilidade do sigilo da
correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas, salvo por ordem judicial.
O juiz Dassler Lettiére descartou as duas possibilidades de violação ao
artigo 5º, porque a lei complementar não fala em interceptações, apenas em dados
bancários sigilosos. Quanto à violação ao inciso X, disse: “Não vislumbro a
inconstitucionalidade da Lei Complementar 105 por violação aos direitos da
privacidade previstos no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal, vez que
mantida pelo legislador a sigilosidade dos dados obtidos e, portanto, respeitada
a manutenção da privacidade do indivíduo”.
Em outras palavras, ele entendeu que a lei obriga tanto o banco quanto a
Receita a manter o sigilo dessas informações dos cidadãos. Ou seja: “Basta não
interceptar comunicações (inciso XII) e manter o sigilo das informações obtidas,
para não violar os direitos inerentes à dignidade da pessoa (inciso X). Isso a
Lei Complementar 105 faz”, anotou o juiz.
Ao negar o pedido, o juiz federal afirmou que o contribuinte não pode se
negar a fornecer as informações de movimentação bancária ao fisco, se há a
obrigação legal de as instituições manterem o sigilo desses dados. “Não há
direito líquido e certo do cidadão em obter proteção do Poder Judiciário para
escondê-la.”
Com a divergência
Com a negativa da transferência das informações entre bancos e Receita, o juiz federal contrariou o que já decidiu o Supremo Tribunal Federal. No julgamento de um Recurso Extraordinário em 2010, o STF definiu, por cinco votos a quatro, que o sigilo de informações bancárias só pode ser violado mediante ordem judicial, e apenas para fins de investigação criminal ou instrução processual criminal. Nunca por meio de ato administrativo da Receita Federal.
O autor do voto vencedor foi o relator, o ministro Marco Aurélio. Ele afirmou
que o repasse dos dados pelo banco à Receita, sem ordem judicial, viola o inciso
XII do artigo 5º da Constituição. O mesmo dispositivo que o juiz Dassler
Lettiére afirmou não ser afrontado pela Lei Complementar 105, autorizando o
repasse das informações ao fisco.
Em seu voto, o ministro Marco Aurélio afirmou que “a inviabilidade de se
estender essa exceção resguarda o cidadão de atos extravagantes do Poder
Público, atos que possam violar a dignidade do cidadão”. Foi acompanhado pelos
ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski.
No entanto, houve quatro votos na discussão do Supremo que entenderam o mesmo
que o juiz federal Dassler Lettiére. A divergência foi aberta pelo ministro Dias
Toffoli. E o que ele disse foi justamete que não há violação se a transferência
de informações foi feita entre entidades que estão obrigadas a manter
sigilo.
Toffoli citou o parágrafo 1 do artigo 145 da Constituição, que diz que,
“sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração
tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos,
identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o
patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.
E concluiu, a partir dele, que o contribuinte tem a obrigação legal de fazer
a declaração de seus bens ao fisco. Foi acompanhado pelos ministros Ayres
Britto, Cármen Lúcia e Ellen Gracie.
Clique aqui para ler na íntegra o acórdão do STF:
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